Você está numa viagem… Uma aventureira em sua mente. Você precisa se conformar com as estranhezas da vida. Somente se encontrar a paz em si mesma, encontrará a verdadeira conexão com os demais.
Em 2018, participei de um estudo divisor de águas do livro “O poder de uma pergunta aberta”, da professora budista Elizabeth Mattis Namgyel, onde em resumo, ela discorre a respeito de uma abertura inerente às variadas circunstâncias da vida, de como quase nada é tão fixo ou rígido quanto parece a ponto de não poder ser sonhado e/ou vivido de outras formas, de como às vezes firmar algo ou se apegar a uma explicação muito rapidamente não é tão interessante, e que seria benéfico aprendermos a conviver intimamente com uma “falta de certeza” que favoreça acatar, sim, algumas definições, mas de fundo mantendo o impulso a novas descobertas, alternativas, ou simplesmente a pacificação diante da ausência de grandes respostas.
Daí que em uma noite peculiar, de pensamentos e sentimentos inquietantes, considerei ser uma boa ideia finalmente assistir ao tão aclamado “Antes do Amanhecer”.
Para quem ainda não viu, o filme acompanha duas pessoas que começam a interagir aleatoriamente, mas que em questão de poucas horas, tornam-se muito especiais uma para a outra e mostram que encontros significativos nem sempre são perfeitamente orquestrados, e por isso talvez se apoiem em estruturas que não comportam urgência, medo, fixação, ideais...
A princípio sem grandes expectativas, terminei arrebatada e não pude deixar de lembrar do estudo, tentando imaginar a sensação de quem acompanhou Céline e Jesse quando o primeiro filme foi lançado lá em 1995 e, junto com os protagonistas, se despediu de momentos tão significativos com aquele ponto de interrogação do tamanho de... insira aqui algo que considera muito grande, e pior, privados da perspectiva de uma continuação.
Depois disso, fiquei pensando que de fato nem sempre há como saber quando estamos diante de algo tão importante, que demande de nós disposição e paciência, mas tendo a acreditar que, como no longa, quando algo assim surge, tudo que o envolve tem uma naturalidade irresistível, ainda que com os possíveis impasses, riscos e dúvidas.
Como uma linha que percorre os caminhos dos envolvidos nessas ocasiões, há o particular de cada um se entrelaçando, afrouxando, apertando, e no caso da Céline e do Jesse, apenas desenrolando até deixar de cada um dos lados, uma ponta solta - mas uma que parece jamais perder de vista a outra.
Mas estou feliz de estar com você. Você não imagina porque uma noite como essa é tão importante para minha vida nesse momento. Mas é.
E a vida acontece...
Até que nove anos depois, os protagonistas da trama ainda estão se perguntando algo que não foi satisfatoriamente respondido da primeira vez, o que por sorte nossa, gerou “Antes do Pôr do Sol”, que é um dos filmes mais tocantes que eu já assisti, e que em um recorte amoroso, trata lindamente dos efeitos de uma questão aberta, de um “e se...” guardado no fundo de uma gaveta, que quase desempenha a função de uma bússola particular capaz de proporcionar separações e cruzamentos muito interessantes.
Em um reencontro delicado, ambos compartilham retalhos de uma vida que seguiu acontecendo mesmo com algo pendente por tanto tempo; seguiu acontecendo com todos os erros e acertos, alegrias, tristezas, encontros e desencontros, mas ainda mais importante, com ela, seguiu o mistério e a motivação que só as indagações ou, quem sabe, as respostas provisórias são capazes de proporcionar.
Na ânsia em que seguimos, buscando previsões, controle, soluções prontinhas e respostas imediatas, o filme, mesmo que de maneira bastante romantizada é claro, convida a um tempo e abertura que mesclam entrega e hesitação constantes, e sem fazer apologia a - mais - esperas tão longas ou uma passividade por vezes desnecessárias, nos lembra que existem mesmo alguns limites bem marcados, outros ocultos, chances únicas, e com eles, apostas que não podemos deixar de fazer.
E continua…
Ainda há o terceiro filme, Antes da Meia-Noite, que é tão bonito quanto os outros dois, só que vai explorar um outro lado da relação, um pouco mais maduro talvez, já abordando efeitos das escolhas que os dois fizeram ao longo dos anos e, acima de tudo, em quais ainda vão continuar investindo. Acho que vale um comentário mais longo, mas em outro texto :)
O ponto aqui era pensar no tanto da vida que é também como uma dança na qual vamos 1, 2, 3, dois pra lá, dois pra cá, gira, pisa eventualmente no pé do outro, flui, abraça, distancia, e de como pode ser bacana se a gente aprender a se movimentar sem tanta inflexibilidade, perguntando, respondendo sem se fixar muito, às vezes guiando, às vezes se deixando guiar, além.
“Deparamo-nos com o não saber, por exemplo, quando somos apresentados a alguém ou quando a vida nos prepara uma surpresa. Essas experiências nos lembram que mudança e imprevisibilidade são a pulsação inerente à nossa existência. Ninguém realmente sabe o que acontecerá de um momento para o outro: quem seremos, o que iremos encontrar e como reagiremos àquilo que encontrarmos? Não sabemos, mas há boa chance de que nos deparemos com algumas experiências duras e indesejáveis, com algumas surpresas que superam nossas expectativas e algumas coisas já esperadas também. E podemos tomar a decisão de estarmos presentes para todas elas.”
O poder de uma pergunta aberta - Elizabeth Mattis Namgyel
Pós-créditos
A Julie Delpy, que faz a Céline, tem um cd com um monte de músicas gracinha e que tem tudo a ver com os filmes, incluindo a derrete coração “A Waltz For a Night”.
E pra descontrair, a Céline que habita em mim, saúda o Jesse que habita em você.
That’s all folks!
De novo, quero agradecer quem tem lido, reagido, conversado sobre o que escrevo 💛
Até a próxima,
Carol.
Ok, sempre tive essa trilogia na minha lista, mas você me convenceu hehe. Vou procurar pra assistir (e esse livro também)!