I need your love,
I’m a broken rose
De vez em quando, consigo escolher algo da minha watchlist e realmente assistir até o fim, e foi assim que dei outra chance pra uma anime que eu já havia tentado assistir anos atrás, mas que só agora se tornou um dos meus favoritos da vida.
Nana começa na simplicidade de um típico slice of life, brincando com leveza com o que num primeiro momento, parece só coincidência. Duas garotas com o mesmo nome (Nana, rs) se conhecem quando estão de mudança pra Tokyo e sentam-se lado a lado em um trem com destino à cidade.
Uma delas tem como objetivo alavancar a carreira musical, a outra, ficar perto do namorado com quem mantinha uma relação à distância. Na chegada, mal se despedem, caracterizando o que poderia ser mesmo apenas um encontro casual entre elas, até que, na busca de ambas por um apartamento, acabam se esbarrando novamente, e pensando principalmente a economia de gastos, num impulso, decidem morar juntas; uma escolha que vai provocar tantos afetos e eventos diferentes que, ao final de tudo, é difícil acreditar que estamos assistindo o mesmo anime de antes, e isso é um baita elogio a esta obra linda.
Personalidades distintas, a construção de uma amizade e de relações amorosas, novidades inerentes aos processos de mudança, amadurecimento, temas mais pesados, dilemas em torno da complexidade da vida adulta, está tudo ali, de uma forma surpreendentemente bem humorada e profunda. A identificação com os personagens é muito facilitada pela autonomia e realidade que a gênia Ai Yazawa conseguiu criar com o núcleo. Não existe uma distinção óbvia entre mocinhos e vilões. Nem mesmo aquele que poderia ser considerado o “malvado” é apenas isso, e a todo tempo vemos que uma rede também sustenta que ele seja nocivo daquela forma.
Chega a ser trabalhoso escolher um dos fios condutores pra escrever a respeito, mas pensando na trama, uma das coisas que mais me encantaram foi o retrato da força sutil e transformadora de uma pessoa aparentemente frágil.
Nana K (ou Hachi), a parte sensível, sonhadora, romântica, gentil e carente da dupla é vista na maior do tempo como uma jovem fraca, vulnerável, inocente e mimada. Mesmo com as repreensões e orientações de pessoas mais pé no chão quanto às suas condutas, ela não desiste de viver os próprios sonhos, por mais descolados da realidade que possam parecer, e ela tem noção disso, o que pode soar irritante, já que não é blindada de um monte de tormentos e insatisfações. A própria se enxerga como aquela pessoa que se orienta principalmente através das relações, que geralmente precisa de um outro que forneça o fundamento à partir do qual ela pode ambicionar e construir alguma coisa.
O que por um lado a torna leal e determinada, por outro nem sempre é diretamente favorável. Abraçando todo o otimismo em si pra se mover em direção ao que quer (mesmo que nem sempre esteja claro), Hachi vai se deparando com muitos entraves e simultaneamente esboçando confusões que, de fora, parecem facilmente evitáveis. Até certo ponto, é incômodo acompanhar a trajetória de alguém que parece não considerar o próprio repertório de experiências e se repete sem cansar, mas acontece que também é muito simples se enxergar em uma figura que vê a cada oportunidade nova, por menor que seja, uma chance de tentar se aproximar de um ideal fantasioso, uma esperança. O famoso “agora vai!”.
Em dado momento, a personagem precisa fazer algumas escolhas que tem o poder de mudar drasticamente o rumo de sua história, e este é outro ponto incrível da obra, porque mais uma vez, o que entra em cena e fala mais alto são as fraturas íntimas dela. Por mais que ela perceba a encruzilhada à frente e chegue a flertar com o caminho contrário ao habitual, outras camadas mais complexas se sobrepõem e a decisão é tomada a partir de uma quebra muito significativa, a qual ela se dispõe, em nome daquilo que considera correto. Nem é justo dizer, com base nas tendências mais emocionadas, que Hachi partia sem nenhuma reflexão ou que não sabia o que estava fazendo; ela tinha todas as provas do quão instável ou questionável era a opção em questão, mas ela também tinha em mente todos os benefícios daquilo.
Longe de romantizar a força incondicional diante de situações super criticáveis e lamentáveis, como era o caso, o que Yazawa fez foi nos apresentar uma personagem que se levanta após a queda, que segue adiante, busca novos rumos e entendimentos apesar de todas as discordâncias, mesmo que seu ponto de partida seja distinto, mais delicado, aberto até pra levar broncas, menos guiado pela praticidade, agressividade, orgulho ou pela pressa em resolver de uma vez por todas alguma coisa.
De outra perspectiva, temos Nana O, a descolada, cabeça fria, talentosa, inteligente, admirável pelo modo como não dá brecha para que os afetos atrapalhem o que precisa ser feito. Alguém que busca manter o controle de si mesma ainda que esteja diante do que mais a comove. Ela quer ser reconhecida pelo próprio trabalho, e em tese, não há nada que possa impedi-la. É só nas micro aberturas que ela consegue mostrar fragmentos de alguém que, igualmente ferida pela rejeição, encontrou outra forma de lidar, mas também não sem consequências, como acompanhamos no pequeno colapso que vem noticiar o quão pressionada ela também está.
Na relação com Hachi e no reencontro com uma pessoa importante do passado, ela vacila, tropeça, se equivoca e altera constantemente a percepção do telespectador a respeito de quem é a mais estável ali. Incrível.
Como se não bastasse tudo isso, a trilha sonora é divina.
Infelizmente, a obra (contemplando mangá e anime) está em hiato indeterminado devido a condição de saúde delicada da autora.
つよくなるため
わすれたえがお
きっとふたりならとりもどす
きづいて
I'm here waiting for you
+, ainda
NANA: A Lesson in Creating Human Characters
Pra quem prefere, também existe o filme
Suas definições de pessoa adulta foram atualizadas
A Boa o Suficiente é minha tentativa de manter a chama blogueira dos anos 00 acesa, fazer jus ao prêmio que ganhei na 4ª série por uma redação e, quem sabe, causar algum efeito positivo nas pessoas que se dispõe a ler o que compartilho nos textos.
Se você gosta do que vê aqui, pode demonstrar seu carinho curtindo, comentando ou compartilhando.
Já vi Nana em várias listas por aí, mas nunca tinha visto sobre o que era. Fiquei curiosa!
E muito obrigada por mencionar a edição da Andanças nos links <3